Os levantamentos mais recentes mostram que mais de 50% dos estudantes da Escola Estadual Padre Anchieta são imigrantes, principalmente bolivianos. Situada no bairro do Brás, na capital paulista, a escola convive todos os dias com um problema que cresceu nos últimos tempos com o aumento da imigração para o Brasil: a Xenofobia.
Victor Gonzales Linares, tradutor peruano, topou o desafio de conversar com uma turma da escola sobre a questão. Sem fugir da sua área de atuação, ele focou a conversa na literatura. Victor é um dos fundadores do projeto Ecos Latinos, que pretende aproximar do Brasil a literatura latino-americana produzida no Peru, Paraguai, Equador e na Bolívia, atrás de Oficinas Literárias e Saraus Artísticos-poéticos.
A Padre Anchieta já havia recebido atividades de Homofobia e Feminismo. Para ver todos os pedidos de lá, clique aqui e nos ajude a encontrar voluntários.
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Nos dias 23 e 24 de março, a rotina da Escola Estadual Residencial Jardim Bambi foi um pouco diferente. Ao invés de voltar para suas classes depois do intervalo, os alunos do 3º ano do Ensino Médio se juntaram para ouvir profissionais de duas áreas bem diferentes: Gastronomia e Fotografia. Os temas foram pedidos no Quero na Escola pela aluna Hilmara Fernandes, representante do Grêmio Estudantil, que fez uma pesquisa entre os interesses dos estudantes.
Conhecendo cozinhas pelo mundo
Para contar mais sobre a profissão dos cozinheiros profissionais, Joseane Marques contou sua história nesse meio: desde sua adolescência – quando já amava cozinhar – passando pelo curso técnico em Hotelaria, a graduação em Gastronomia e suas experiências profissionais no Brasil e no mundo.
Seus relatos sobre suas vivências em cozinhas de outros países deixaram os alunos bem curiosos. Ela deixou claro que a profissão envolve trabalho duro, muitas vezes em fins de semana e feriados e baixos salários no início da carreira. “Em muitos lugares que fui trabalhar não tinha salário, eram estágios pela experiência mesmo”, ela contou.
Joseane (à esquerda) com a equipe de um dos restaurantes em que trabalhou na Suécia
E por falar em remuneração, Joseane indicou o caráter elitista da profissão, que tem poucos e caros cursos de graduação de qualidade – mas incentivou que os estudantes buscassem cursos de extensão gratuitos e programas de bolsa. Um desses projetos, é o Gastromotiva, que oferece cursos de capacitação na área para jovens de baixa renda.
Outro ponto ressaltado por ela foi a questão da responsabilidade do profissional da Gastronomia em representar seu país ou a instituição que estuda. “Se eu for para outro país e fizer um trabalho meia-boca posso estar comprometendo outros que vierem depois de mim, vão pensar que os brasileiros em geral são maus profissionais”, explicou ela.
Mais que uma palestra sobre comida, o principal tema da palestra foi a cultura. Mesmo no Brasil, Joseane segue encarando choques culturais: atualmente está trabalhando em um projeto com refugiados árabes. A cozinheira também fez questão de valorizar a culinária brasileira: “A experiência internacional é importante para o currículo, mas tem muitos ingredientes brasileiros que você não encontra fora daqui, nossa culinária é muito rica e diversa e nós precisamos valorizar isso”.
Fotografia além do óbvio
Assim como a Joseane, a paixão da Gabriele Diola por fotografia e audiovisual começou na juventude, aos 16 anos. Hoje ela é formada no Técnico em Processos Fotográficos pelo SENAC e cursa Produção Audiovisual, e resolveu dividir um pouco dessas experiências com os estudantes.
Gabriele focou sua apresentação na fotografia criativa e reforçou que um dos desafios desse campo é justamente o esforço para criar coisas diferentes. Passou também a ideia de que uma foto é capaz de contar uma história, que vai além de algo meramente técnico. E ela finalizou deixando um desafio para os estudantes: compartilhar com ela. pelas redes sociais, alguma foto de autoria própria que represente uma história e saia do comum.
“Minha relação com a fotografia vai além de trabalho, é um meio de expressão. Hoje, cultivo um canal no YouTube e um Instagram onde compartilho com as pessoas o mundo da forma que vejo e capturo. O que me move dentro da fotografia e do audiovisual é inspirar os outros e ser inspirada”, ela conta. E da atividade, saiu motivada: “A experiência foi incrível, eu fui super bem recebida pela escola e pelos alunos, a palestra foi super bacana e todo mundo interagiu muito. Me pediram pra voltar e eu quero voltar mais vezes!”
Mais pedidos e profissões por vir
Depois dessas atividades, os estudantes da escola demonstraram interesse por outras áreas: Direito, Psicologia, Medicina, Veterinária… E fizeram seus novos pedidos no Quero na Escola. Um médico já se inscreveu para conversar com os estudantes sobre essa profissão.
E outro pedido chamou nossa atenção: Artes Marciais. Como a quadra da escola está em reforma, já faz tempo que a escola não tem aulas de Educação Física e esse esporte seria uma forma de driblar esse problema, utilizando outro espaço. Estamos em busca de praticantes dessas lutas para fazer isso acontecer e movimentar mais um pouco o cotidiano por lá.
Quer ser voluntário realizando uma atividade nessa escola, veja todos os pedidos deles aqui e se inscreva. É aluno de escola pública e quer atividades assim em sua escola? É só pedir no site: www.queronaescola.com.br.
No Quero na Escola o Mês Internacional da Mulher foi marcado por atividades não de comemoração, mas de discussão sobre igualdade de gênero em escolas públicas de São Paulo. Antes e depois do 8 de Março, voluntárias foram a escolas estaduais de São Paulo falar com meninas e meninos sobre o tema.
Na véspera do 8 de março, a Escola Estadual Padre Anchieta, no bairro do Brás em São Paulo, recebeu duas atividades diferentes com feministas que foram conversar sobre os desafios para combatermos a desigualdade de gênero. Na semana passada, teve mais: a jornalista Lizandra Magon de Almeida foi à Escola Estadual Caetano de Campos, também em São Paulo, na Aclimação, dividir sua experiência como feminista e editora de livros do gênero na Editora Pólen.
Derrubando o patriarcado entre uma jogada e outra
Na manhã do dia 7, no Brás, quem guiou a atividade com duas turmas do 2º ano do Ensino Médio foram as meninas do Fast Food da Política, um projeto que pretende explicar as instituições e trâmites políticos de forma lúdica. Por entender que a questão de gênero é transversal e essencial para o debate político, elas criaram o Molho Especial, com jogos voltados especificamente para esse tema.
Elas começaram questionando o que os estudantes acreditavam ser Política e Machismo, dois temas essenciais de serem discutidos e muitas vezes considerados como tabus. Sobre a Política, fizeram principalmente críticas: corrupção, vergonha, alegaram ser algo chato e desinteressante. Já sobre o Machismo, as respostas variaram: “É quando o homem acha que a mulher é incapaz de exercer profissões, de entrar na política, de achar que ela não pode usar uma roupa decotada, que é feita para lavar e passar” ou “Machismo é algo que existe a muito tempo e só recentemente as mulheres querem ter direitos iguais, na minha opinião é muito cedo para isso acabar”.
Com a discussão iniciada, foi hora de começar a jogar “A Queda do Patriarcado”. O jogo consiste em ir desmontando um pilar composto por blocos – cada um representando uma questão específica de desigualdade de gênero da nossa sociedade – e ir refletindo sobre as questões: falta de acesso a cargos altos, desigualdade salarial, feminicídio, pornografia, entre outras.
Cada peça abre uma discussão, por exemplo, um dos alunos retirou a peça Pornografia e revelou aos colegas o fato que “Segundo estudos de 2015, a expectativa de vida média entre atrizes pornô é de 36,2 anos”. E os estudantes foram levantando hipóteses do porquê: doenças, depressão… O jogo segue assim, até que toda a estrutura seja desmontada e uma nova sociedade possa se montar a partir de novos blocos.
Empoderamento feminino a partir de informação
À noite, no mesmo dia 7, foi a vez da Ana Paula Souza, fundadora do site Lado M, falar sobre empoderamento feminino e desigualdade de gênero para estudantes do 3º ano do Ensino Médio e do EJA. Ela levantou diversas questões da cultura patriarcal e machista de nossa sociedade, inclusive levando algumas experiências pessoais de sua infância no Belém do Pará, além de outros exemplos de situações tipicamente machistas do cotidiano.
Ela destacou muito a questão dessa cultura não afetar apenas as mulheres, mas também aos homens e aos homossexuais. Por apresentarem características mais ligadas ao sexo feminino, como sensibilidade, homens podem sofrer preconceito: “Por causa dessa cultura que não tolera o feminino, as características femininas, tanto em mulheres quanto em homens, resultam em formas de violência”.
E seguindo na questão da violência, Ana falou da formação diferente entre meninos e meninas e dos estereótipos atrelados ao gênero. “Os homens são mais estimulados desde pequenos a assumirem posição de liderança, a serem os chefes da casa e no trabalho. O problema disso é que quando a gente cresce, cria-se uma relação de desigualdade em que um manda o outro obedece, é daí que começam as situações de violência doméstica”, ela explica.
Na roda de conversa, houve espaço para os estudantes expressarem suas ideias. Um dos alunos apontou que, apesar das questões levantadas, a sociedade e os direitos das mulheres já avançaram bastante. Outra aluna foi mais crítica: “O homem ainda, tem muitos, que tem a cabeça de ogro. A mulher é que tá se impondo para deixar de receber ordens”.
Sexta-feira à noite na escola debatendo Feminismo
Na Escola Estadual Caetano de Campos um grupo de alunos já entrou no fim de semana refletindo sobre questões sérias. Na sexta-feira passada, dia 17, a jornalista Lizandra Magon de Almeida foi até lá bater um papo sobre questões de gênero, um pedido da Thayline Cunha, que é estudante do 3º ano do Ensino Médio e integrante do Grêmio Estudantil.
Depois de introduzir o tema, levantando alguns dados sobre a desigualdade de gênero, a voluntária abriu a discussão para ouvir os questionamentos dos alunos. Demorou um pouco para quebrar o silêncio inicial da timidez, mas a discussão logo deslanchou quando um dos estudantes presentes disse: “Acho que isso aí é coisa das nossas avós, já passou já, hoje a gente já sabe que não é assim, já melhorou muito”. Frente ao posicionamento “otimista” do colega, as estudantes presentes e Lizandra expuseram alguns indícios de que estamos longe da igualdade de gênero.
Seguindo a conversa, Brenda, do 2º ano do Ensino Médio, levantou a questão do aborto, perguntando quem dos presentes era a favor da descriminalização, uma das principais pautas do movimento feminista. A partir daí, o debate foi longe, dividindo a sala praticamente ao meio entre as que apoiavam ou não a mudança na lei. Uma aluna rebateu a questão dizendo que concordava com o aborto em casos de estupro, mas não quando há consentimento da mulher. Brenda, que se mostrou a favor da descriminalização, reforçou: “não entendo qual a diferença, já que (se for considerar que é vida desde a concepção), a vida que está dentro da mulher é a mesma”.
O horário de aula acabou às 22h e cerca de 15 estudantes permaneceram na sala discutindo o tema. Até que a conversa seguiu pelos corredores entre alunos e professores presentes. Na saída, as alunas foram pensando outras atividades abordando temas feministas que poderiam realizar: “acho que precisamos muito falar sobre o feminismo negro aqui, trazer uma pessoa trans para falar da sua experiência”.
Lizandra, que edita livros com temática de gênero em sua editora, a Pólen, doou para a biblioteca da escola um exemplar do livro “Você já é feminista”, escrito por várias mulheres e organizado pela Revista AzMina. Segundo Thayline, primeira a emprestá-lo, a fila para ler depois dela já está grande.
O estudante Thales Silva, 16 anos, se inscreveu no Quero na Escola pedindo “Psicologia” porque está no último ano do Ensino Médio e esta é uma das carreiras que ele pensa em seguir. Além dele, 34 colegas – a maioria dos quais nem frequenta as aulas às sextas à noite – resolveram participar do bate-papo com a psicóloga Stefanny Bauman, que se voluntariou para palestrar e os encontrou na última sexta, 17 de fevereiro.
O estudante acabou dando um passo para trás na escolha do futuro profissional, mas ficou satisfeito. “Adorei, ela foi super esclarecedora. Nota 10. Mas vou seguir o conselho dela e decidir com tempo, sem pressa”.
Outros alunos aproveitaram assuntos gerais que envolvem a área. Ao falar dos casos que levam à terapia e de observações do comportamento humano, Stefanny acabou ajudando jovens e professores. “Tem hora que as pessoas não estão preparadas para ouvir. Tem vezes que algo é claro pra você, mas você não vai ajudar a outra pessoa simplesmente falando. Tem que haver uma preparação”, comentou sobre como ajudar amigos e parentes.
Stefanny também falou sobre trabalhar emoções e não responder por exemplo a todo comportamento diferente do seu na vida e nas redes sociais. “Não é uma fala sua que vai fazer a pessoa mudar de ideia. Então, pense se realmente é válido”.
A coordenadora Verônica do Nascimento, participou ativamente. “Normalmente, sexta à noite, a maioria dos alunos não vem. Esta semana avisamos da palestra e tivemos sala cheia. A escola ganha muito com estas participações que nos tiram da rotina.
Qualquer estudante de escola pública pode se inscrever no Quero na Escola e dizer o que gostaria de ter a mais na sua escola:
“Já tentaram me ensinar que a criança nasce homossexual, mas eu não consigo acreditar nisso”, compartilhou uma aluna da Escola Estadual Padre Anchieta, no Brás (São Paulo – SP), logo no início da conversa sobre homofobia, organizada pelo Quero na Escola na última sexta-feira (2). O voluntário Fábio Meirelles – que foi por quatro anos Coordenador de Direitos Humanos do Ministério da Educação, responsável por conduzir sua política de gênero e diversidade sexual –, foi à escola para falar do assunto solicitado por outra aluna, Ester Passos.
Fábio começou a conversa perguntando se os alunos acreditavam haver uma opção sexual, ou seja, que as pessoas escolhem por qual sexo vão se sentir atraídas sexualmente. Questionou também qual seria a diferença entre orientação sexual e gênero, e, logo de cara, as opiniões contrastantes começaram a surgir. Ester mostrou estar preparada para o debate e em consonância com o voluntário, elencando todas as orientações sexuais e expressões de gênero que conhecia: “Hetero, Homo, Bi, Assexuado, Trans, Travesti…”. Já outro aluno mostrou acreditar no contrário: “Tem sim muita gente que virou gay pela moda”.
Alunos que participaram mais ativamente do debate até o final, contrastando opiniões de forma respeitosa e sem agressões.
Com o tempo, o debate foi ficando cada vez mais quente e Fábio ficou com o papel de mediador das trocas entre os alunos e as alunas que queriam colocar ansiosamente suas opiniões na roda. “Homossexual não quer respeito, quer privilégios. Já vi debates em que eles pedem leis exclusivas! As leis deveriam falar de preconceito no geral”, retomou a aluna que abriu a discussão, com apoio de um colega: “Sim, tem que se preocupar com a população como um todo”.
Frente a esses posicionamentos, Fábio explicou que populações como a LGBT e a negra sofrem, objetivamente, mais preconceito que a sociedade como um todo. “É preciso olhar com uma lupa para essas pessoas que passam por vulnerabilidade”, explicou, reforçando a necessidade de políticas específicas de proteção a minorias. Com a dinâmica de cada um poder falar suas opiniões abertamente, não demorou até que o tema fosse expandido para outros assuntos como o feminismo e o aborto.
Alguns professores também participaram com suas opiniões: “Não existe mãe-solteira, existem mães. Esse estigma de solteira é colocado pela nossa cultura”, pontuou Jean, que dá aulas de Português, pegando carona na fala de uma aluna que relatou ter sido criada apenas pela mãe. Mas o docente que mais impressionou com um relato marcante foi o Fernando Queiroz, professor de Língua Portuguesa:
“Sou professor e ex-aluno dessa escola, onde sofri muito bullying. Se eu pudesse escolher, eu escolheria ser homem, para não sofrer com o preconceito”, ele compartilhou. E continuou, fazendo referência a Luma Andrade, a primeira travesti a concluir um doutorado no Brasil: “A genitália não pode predominar sobre o pensamento. E nem venham falar de igualdade não, porque a gente não tem igualdade”.
Professor Fernando falando de sua experiência pessoal como homossexual na escola.
Outra afirmação comum entre os alunos e professores foi a de que ninguém seria obrigado a aceitar a orientação sexual alheia, mas sim a respeitar. Ao que Fábio ressaltou que é importante tomar cuidado porque “você pode não aceitar, mas considerando as questões de estereótipos, pode acabar colaborando com a opressão”, explicou, citando a tradicional divisão de cores e brinquedos entre meninos e meninas.
Quem se posicionou, também, foi a Jennifer Santos Sousa, professora de Sociologia da escola, que deu uma aula de tolerância: “Temos que pensar que vivemos dentro de um sistema cultural, transmitido através da educação. Todos vocês são iguais? Aqui na escola mais de 50% são imigrantes e sempre pergunto para eles se a cultura no Brasil é igual à Bolívia, ao Perú, sempre dizem que não”, explicou. “Temos que reconhecer a diferença e possibilitar espaços como esse, em que o diálogo seja possível”, concluiu, reforçando a importância dos debates que, segundo ela e os alunos, são pouco frequentes no ambiente escolar.
A troca de ideias foi proveitosa e, apesar do clima quente, todos se respeitaram e ouviram as opiniões dos outros sem partir para a agressão verbal. Uma cena que ilustra bem essa característica saudável do debate aconteceu na despedida, quando o professor Fernando disse a um aluno: “Olha, eu gosto de você, viu? Não concordo com as suas opiniões, mas gosto muito de você”.
“Foi super legal participar do debate, e principalmente saber que uma estudante de escola pública fez esse pedido. Acho que os alunos, professores e a coordenação da escola gostou muito, até pediu para a gente repetir”, conta Fábio sobre sua experiência como voluntário, afirmando que espera se candidatar mais vezes para conversas assim.
Em fevereiro deste ano, o advogado Alexandre de Salles Gonçalves nos enviou um email: “O que os alunos querem na escola aqui em Curitiba eu não posso oferecer (Yoga, programação e fotografia). Mas gostaria de me voluntariar para colaborar da forma como for possível. Minhas áreas de interesse seriam em palestras/cursos sobre noções de direito, contratos, direito do consumidor, direito de família, direito constitucional, direitos humanos, filosofia e psicanálise”.
Em julho, a estudante Ana Paula de Carvalho, que já tinha sido atendida com duas palestras sobre Fotografia (veja aqui e aqui) pediu um debate sobre Política. O Alexandre se inscreveu para atender, mas tivemos que esperar as férias escolares e a licença do diretor Dario, nosso parceiro na organização das atividades do Quero na Escola, acabarem. Em setembro começamos a organizar o evento, mas, como já estávamos muito perto das eleições municipais, a gestão da escola achou melhor esperar o momento passar.
E assim, em novembro, o Alexandre visitou a escola para falar sobre Política e a realação com a Psicanálise. Membro da Associação Psicanalítica de Curitiba e advogado há 15 anos, Alexandre estuda o tema há três anos e mostrou como a política permeia a vida dos estudantes. “Comecei a abordagem falando sobre a origem da palavra na Grécia e mostrando que o cidadão é um sujeito político. Introduzi um pouco sobre a psicanalise dizendo que o que comanda a vontade do sujeito dentro da pólis e as relações dele são reflexo das relações que ele tem com o seu interior. O dentro é formado pelo inconsciente, que comanda a nossa razão, e a razão é usada para justificar o nosso desejo”, contou Alexandre.
Para Ana Paula, a palestra mostrou como a política está relacionada à vida dos estudantes. “Ele falou sobre as ocupações e mostrou que a política se estende até nas simples ações”, resumiu a aluna que se forma este ano e teve seus pedidos atendidos cinco vezes pelo Quero na Escola este ano.
Alexandre lembrou os estudantes que o orçamento da escola pública é público e que eles poderiam usar a internet para acompanhar e conseguir verba para melhorias e projetos do interesse deles. “Me preocupei em fazer acender algumas luzes, fazer eles se questionarem”, disse.
“Ator para conversar com os alunos sobre teatro”. Este foi o convite que bastou para levar Caio Marinho, ator e cenógrafo, a conversar com estudantes de 7º ano da Escola Estadual Anne Frank, em São Miguel Paulista, em outubro. As perguntas mais inocentes foram as primeiras: você pode chorar sem estar triste? O beijo é de verdade? Tem que ser “sem vergonha” (desinibido) para ser ator?
Caio explicou com exemplos e comparações. “Saber chorar eu sei, mas fazemos isso dentro da necessidade, como um médico faz a cirurgia, é da profissão e tem um propósito”, respondeu à primeira pergunta. Depois perguntou se eles considerariam beijo de verdade, mesmo com todas as câmeras e o fato dos atores estarem preocupados com várias outras coisas durante, como a posição em relação à plateia ou à câmera, o texto seguinte e como exatamente é para fazer o beijo. “Se for alguém que você realmente queria beijar, vai ter de tentar depois.”
Caio chegando a EE Anne Frank, em São Miguel Paulista
Já sobre alguém tímido poder ser ator, a resposta foi mais complexa. Caio contou que é tímido e que, ao entrar ali na escola, por exemplo, sentiu timidez, mas quando está no palco ou diante das câmeras, é trabalho. “É um trabalho que me ajudou a vencer a timidez também e me colocar para diversas situações importantes”, completou e contou que, quando adolescente, teve a mesma dúvida e foi influenciado por um professor.
“Eu tinha muita vontade desde sempre de ser ator, mas me perguntava se tinha vocação e e ele me falou uma coisa que me marcou muito e digo a vocês: estas palavras são uma só, vocação é vontade. Se você tem muita vontade, vai se dedicar e vai ser bom naquilo.” Caio acabou fazendo curso técnico na área, se formou pelo Teatro Macunaíma e em Licenciatura em Arte-Teatro na Unesp. Hoje atua em teatro com A Próxima Companhia e também participou do longa “O Rei das Manhãs”, previsto para estrear em 2017.
A visita foi um pedido do professor de Língua Portuguesa, Mario Rocha, durante o Quero na Escola – Especial Professor, ação em parceria com a Fundação SM, em que os professores puderam pedir visitas. “Meus alunos são ótimos e queria que eles tivessem acesso a alguém que falasse de um ponto de vista diferente do que estão acostumados”, comentou.
Caio falou com duas salas diferentes e a maioria dos estudantes de cerca de 13 anos nunca havia ido ao Teatro. Os que foram, tinha sido levados pela família a peças no Centro de São Paulo. Caio listou teatros na zona leste e até mesmo centro culturais com cursos para estudantes como os da Fábrica de Cultura. “Fiquei muito feliz. Recebemos uma visita ilustre na escola, tenho certeza que plantou novas ideias na cabeça dos alunos”, comentou Mario.
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“Eu tiro foto para guardar o sentimento daquele momento”. A frase de um estudante foi uma das respostas à provocação feita pelo fotógrafo Gil Inoue, que foi a Etec Jaraguá, na zona norte de São Paulo, atender a um pedido por Fotografia feito no Quero na Escola. Mais que na técnica, focou principalmente na troca de ideias sobre a expressão da fotografia e o conceito de beleza por trás das fotos de celebridades e das redes sociais.
“As pessoas estão querendo passar uma imagem de algo que elas não são”, disse levantando logo de cara a questão dos padrões estéticos valorizado pelas revistas. E disso ele pode falar à vontade, já que boa parte de seu portfólio é composto por fotos de grandes artistas – como a capa do álbum do cantor Criolo – e capas de grandes publicações da moda – como a Vogue e a Elle ou a Glamour deste mês, com Bruna Marquezine.
Capa de disco do Criolo com foto de Gil
Depois da pergunta inicial para entender qual era a relação dos alunos com a fotografia, ele contou um pouco de sua trajetória. Também estudou em escola pública e começou a carreira como assistente de fotógrafos que admirava – inicialmente com funções básicas -, mas com o tempo foi aprendendo e se aperfeiçoando. Se mudou para Nova York em 2004, onde consolidou sua trajetória e viveu por 12 anos.
“É engraçado que alguns americanos e europeus quando visitam São Paulo comentam o quanto veem beleza em nossas ruas pichadas”, contou Gil sobre a experiência de voltar para a cidade natal mais de uma década depois com novos olhos. “Eu precisei desse tempo fora para voltar e perceber o que é belo aqui”, completou, estimulando os alunos a ficarem abertos a belezas em seus cotidianos.
Gil mostrou um pouco de seu trabalho, que inclui diversas capas, de revista a capa de disco, e comentou a que fez para o cantor Criolo: “Demoramos mais de meia hora para tirar essa foto dele com os olhos fechados. Na hora de fotografar é preciso criar uma atmosfera. Colocamos uma música clássica para tocar, fomos experimentando até sair essa”. E admite: “Fiquei tanto tempo fora que nem sabia da importância dele! Cheguei a perguntar se ele cantava MPB”, contou rindo.
O fotógrafo mostrou algumas possibilidades de experimentação com as imagens. Fotos que são “remixadas” para passar uma mensagem, como essa releitura da famosa foto de um manifestante diante de uma coluna de tanques, ícone do massacre da Paz Celestial na China em 1989. “É legal isso de poder recriar em cima de algo que já existe. Você não precisa tirar a foto propriamente para produzir material visual”, explicou.
Exemplo de “remixagem” feita por softwares de edição de imagens
E para não dizer que não falou das técnicas, Gil também mostrou um pouco da origem das dos ajustes gráficos que hoje são facilmente aplicados – às vezes de forma exagerada – com ajuda de softwares como o Photoshop, mas antigamente precisavam ser feitos com máscaras e aplicação de luz para corrigir o brilho, contraste ou cor da imagem feita.
Durante toda a conversa os alunos participaram colocando suas opiniões e citando casos próximos de pessoas que dão muita importâncias às fotos das redes sociais. “Eu curti, achei diferente, a gente não tem nada assim aqui na escola”, contou Amanda Santos, autora do pedido no Quero na Escola, que esperou quase um ano até que o voluntário aparecesse e vários obstáculos da agenda da escola fossem superados, para haver o encontro. “Gosto de fotografia só como hobby, tenho uma câmera mas nem uso muito. Fiz esse e outros pedidos porque acho legal, é um diferencial que a escola pode agregar”, diz ela, referindo-se à possibilidade de inserir aulas diferentes por meio do site.
E seu pedido realmente somou para seus colegas: “Achei interessante pra a gente abrir os olhos para o que a gente vai querer fazer”, compartilhou Paloma Moreira, aluna do primeiro ano do Ensino Médio. E para o fotógrafo a experiência foi inédita e enriquecedora: “Foi a primeira vez que participei de um projeto desse. Os alunos foram muito acolhedores e se envolveram bastante na conversa, que acabou assumindo outros caminhos, não só de fotografia. Conversamos sobre estética e sobre os padrões de beleza impostos pela moda no mundo de hoje. Adorei a experiência e estou animado para a próxima!”.
O encontro também rendeu um novo pedido para a unidade, dessa vez para falar sobre outra arte visual: o Cinema. Dá uma olhada na página da Etec Jaraguá no Quero na Escola, quem sabe tem um pedido que você pode atender.
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Você já deve ter ouvido falar que o Sol vai acabar daqui alguns milhares de anos, né? Também deve ter acompanhado quando Plutão perdeu sua categoria de planeta. Atendendo ao pedido do aluno Aderson Silva no Quero na Escola, a Escola Estadual Anecondes Alves Ferreira recebeu o Lucas Moda, estudante de Astronomia na USP, para falar dessas e outras questões curiosas.
Lucas desmistificou algumas ideias em torno dos astros. “Sei que é sem graça, mas a maior parte do Universo não tem nada”, disse logo no início. “Mas como não é muito legal ficar falando sobre nada, vou falar sobre o que existe”, continuou, e aproveitou para deixar clara a diferença entre Astronomia e Astrologia. Para ele, a crença que os astros definiriam características e comportamentos não é apoiada em nenhum estudo científico.
Ele seguiu com outras curiosidades, explicando como surgem e morrem as estrelas, por exemplo. “Sem querer desanimar, gente, mas as estrelas são, basicamente, um acúmulo de gases”, conta. Os alunos também aprenderam como se dá o ciclo de vida dessas estrelas até sua “morte”, fenômeno que justifica a extinção do Sol, sobre a qual ouvimos tanto falar.
São essas “estrelas mortas” que dão origem a outro conhecido fenômeno: o buraco negro. “Neles a gravidade é tão alta que supera a velocidade da luz, por isso são chamados assim”, ele explica. A palestra passou de maneira superficial por diversos outros conceitos e termos da Astronomia, dando referências para aqueles que se interessam pesquisar mais sobre o assunto.
Como é o caso do Aderson: “Gostei da experiência. Não vou cursar a área porque não tenho habilidade em Matemática, mas sempre gostei de Astronomia”. Ele conta que escolheu seguir a área da Neurociência e que fez o pedido pensando mais nos colegas que em si mesmo: “Pedi para eles conhecerem mesmo. É algo popular, mas ninguém conhece nada. Todo mundo conhece uma estrela, mas ninguém sabe o que É uma estrela”.
O professor de Matemática Rodrigo Mioto também acompanhou a palestra e se esforçou para conseguir um microfone para facilitar a palestra. “Foi uma pena que precisei sair algumas vezes para arrumar isso, porque eu gosto muito de Astronomia, gostaria de ter mais tempo para estudar o tema”.
Para Lucas, a experiência também foi enriquecedora: “Quis ir para me desafiar, quebrar alguns preconceitos e paradigmas que a gente cria vivendo na bolha da sociedade elitista padrão”, ele conta, reconhecendo o privilégio de estudar em uma faculdade pública renomada. “Acho que a gente sempre tem que acreditar, enquanto tiver alguma coisa que você possa fazer, alguma semente que consiga plantar, tudo é válido”, e completa dizendo que está a postos caso chegue mais pedidos sobre o tema.
A Escola Estadual Anecondes Alves Ferreira já recebeu diversas atividades do Quero na Escola, principalmente ligadas ao tema dos direitos humanos, a próxima será sobre Feminismo. Para ver todos os pedidos da escola, clique aqui, pode ser que você consiga atender algum.
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Ensino híbrido, personalizado, por rotação… esses foram alguns dos conceitos apresentados para os professores da Escola Estadual Myrthes Therezinha Assad Villela, no município de Barueri, Grande São Paulo atendendo a um pedido da coordenadora pedagógica por uso de tecnologia na sala de aula no Quero na Escola – Especial Professor. Marcos Soledade, formado em Sistemas de Informação pela USP, co-fundador da plataforma Sílabe e empreendedor há mais de cinco anos, dividiu com os docentes formas de usar dados na educação, entre outras dicas.
A conversa girou em torno do que seria a “educação contemporânea” e de metodologias inovadoras que podem auxiliar o professor a engajar seus alunos. Como, por exemplo, a “Sala de aula invertida”, prática que consiste em pedir para que os alunos preparem algo sobre determinado tema antes de uma aula, depois verificar o que foi preparado, conseguindo um diagnóstico do quanto os alunos sabem daquele assunto e apresentar conteúdos que tenham faltado nessa pesquisa e, por fim, pedir uma nova atividade, após a aula expositiva, para consolidar o aprendizado sobre o tema.
Essa e diversas outras práticas mostram que, para ser inovador, não necessariamente um professor precisa ser digital. A professora de Matemática Noeli Fatima dos Reis, que era ali a “aluna”, mostrou-se uma prova disso: “Eu trabalho em grupos, não gosto de aluno enfileirado. Em todas as minhas atividades eu colho pontuações, não é avaliação. Isso cria uma competição amigável na sala”, contou ela sobre as atividades que já aplica em sua sala de aula.
Marcos deu a palestra duas vezes, para atender um maior número de professores
Ela contou ainda que a autorregulação vai além da disciplina: os mais avançados na matéria, ajudam aqueles que ainda não compreenderam todo o conteúdo, deixando Noeli mais livre para se dedicar aos alunos com mais dificuldade de interação e aprendizado. “Os próprios alunos começam a ajudar e cobrar uns aos outros para não ficar para trás nesse placar”, ela diz. “Também diversifico, não fico restrita à atividade daquele ano. Faço paralelos entre matérias para recuperar alguns conteúdos de forma contínua”, mostrando sua versatilidade como docente.
Além disso, ela resolveu abolir a avaliação tradicional para o último bimestre: “Eu pedi pra eles uma entrevista e pesquisa. Eles vão jogar na tabela os dados e fazer gráficos de setor e de barras. Aí, na hora da aula, vão fazer o comentário das entrevistas, como foi, o que a pessoa disse. Eles vão arrumar os dados, e eu vou orientá-los como organizar: estatística, né?”, conta Noeli, revelando mais um método inovador que aplica dentro de suas possibilidades.
Mas, quando o assunto é passar essa metodologia para o digital, ela lamenta: “Não tenho habilidade com informática, então não tenho autonomia para passar para eles. E eu acho que me ajudaria muito, porque eles fariam essa tabela no Excel, que já geraria os gráficos automaticamente”, conclui a professora, que está contando com a ajuda do cunhado para aplicar essas tecnologias em suas aulas.
A professora Tatiane Constanço da Cruz, de Sociologia, também dividiu alguns métodos diferentes dos tradicionais que usa em suas aulas: “Por exemplo, fui dar uma aula sobre a indústria cultural, sobre música, e um aluno me perguntou se podia ouvir música. Eu deixei e, daqui a pouco todo mundo tava com fone, escutando música, quietinho, fazendo a atividade”, conta. Ela também usa uma ferramenta digital para planejar suas aulas e criou um grupo no Facebook para trocar dicas e informações relevantes à aula com seus alunos: “a gente compartilha tirinhas, questões e dicas de vestibular”.
Marcos mostrou algumas das funcionalidades da plataforma que desenvolveu, a Sílabe, que tem como principal público os professores e as escolas públicas. Os docentes se mostraram interessados, ainda que indicando as dificuldades de aplicar as novas tecnologias, por falta de estrutura das escolas e de formação dos professores. Cristiane Barbosa, por exemplo, que dá aulas de Física, gosta de mostrar aos alunos simulações de experimentos, mas os programas que usa para essas demonstrações não rodam no computador da escola. “É bom porque eu acabo indicando sites e vídeos para os alunos, e com essa plataforma eu conseguiria juntar tudo em um lugar só”.
Para o voluntário, a troca de experiências do encontro também foi enriquecedora. “Eu não sabia o que esperar. Apesar de eu já ter algum contato com escolas, são sempre escolas que entram em contato com a gente porque já conhecem o que a gente faz e que, geralmente, já usam metodologias inovadoras”, ele conta. “Mas foi incrível. Primeiro porque você consegue coletar feedback dos professores, o que é essencial. E segundo porque os professores que você menos espera estão fazendo coisas super legais, mesmo em uma escola pública, com poucos recursos.”
O bate-papo foi o segundo encontro sobre o tema, atendendo ao pedido da coordenadora Kelly Cunha Lopes no Quero na Escola Especial Professor, parceria com a Fundação SM, que deu de presente para os educadores a presença de pessoas para ajudá-los no que pediram no Mês dos Professores. O grupo já havia recebido o também professor Ricardo Nunes, que falou sobre o uso das ferramentas do Google em sala de aula.
Todo estudante de escola pública pode se cadastrar e dizer o que gostaria de aprender na sua escola. Um voluntário pode querer ajudar. Cadastre-se www.queronaescola.com.br